segunda-feira, 12 de novembro de 2007

O Ventre Louco

Primeiro dia de aula no colégio novo. Bem no fundão da sala, um rapaz loiro de catorze anos empenha-se ao máximo para aparecer o mínimo, embora saiba que seu anonimato durará até que a professora anuncie seu nome na lista de chamada:

– Arno Kuh Zitto!

A classe vem abaixo, em gargalhadas tão altas que impedem a professora de escutar o “Presente!” proferido por Arno, sem impedi-la de dar uma bronca:

– Que fique bem claro que, nesta sala de aula, eu não irei tolerar nenhum tipo de indisciplina!

Durou pouco o sossego de Arno. No recreio, um valentão veio provocá-lo:

– E aí, Nuku? Muito ar entrando e saindo?
– Qual o seu nome? – respondeu Arno com uma pergunta, a calma de quem já passara por aquela situação e sabia exatamente como se defender.
– Num interessa, viado! – rebateu o grosseiro. E os presentes escutaram uma bufa escandalosa trombeteando dele.
– Então vou te chamar de Hélio. O primeiro dos gases nobres da tabela periódica! – disse Arno, em meio a nova saraivada de risos escandalosos, e se foi. Sabia que tinha deixado de ser o alvo das piadas em favor do valentão.

Aos poucos as pessoas percebiam que, estranhamente, sempre que alguém vinha provocar Arno, acabava produzindo traques altíssimos e vexatórios. Aos poucos, as gozações em torno de seu nome cessaram e Arno pôde se enturmar.




Ser corno ou não ser? Eis a minha indagação...


Assim, descobriu Sarah Donna, a garota mais linda e loira do colégio e naturalmente cobiçada pelos caras. Sarah, no entanto, além de linda, era certinha. Podia ser o Gianecchini; fizesse uma grosseria, um palavrãozinho mínimo que fosse, lá se iam as chances do rapazola com ela.

Apaixonado, mesmo sabendo que não era bonitão, Arno tentou aproximar-se dela como amigo.
Entretanto, a garota não ficava muito tempo comprometida. Mais cedo ou mais tarde um namorado ressonava em flatos nas situações mais impróprias, e o relacionamento acabava. Sem que ninguém percebesse, Arno estava sempre por perto, escondido e divertindo-se.

O tempo foi passando, e Sarah, agora amiga e confidente de Arno, vendo a demanda masculina se esvaindo, passou a achá-lo, além de muito educado e atencioso, “Até que bonitinho”. Semanas depois, estavam namorando, e anos mais tarde, ficaram noivos.

Um dia antes do casamento, Arno apareceu de surpresa na casa de Sarah. Estava tenso.

– Sarah, nós sempre fomos honestos um com o outro, mas preciso te contar uma coisa sobre mim antes que a gente case!
– Que foi? Nossa, você está com uma cara...!

Logo que disse isso, ambos escutaram o vagido fino de um pumzinho espremido. Sarah corou na hora.

– Ai! Putz! Desculpa, Arno, eu...
– Sou eu quem tem que pedir desculpas. Preciso te contar um segredo. Desde a infância eu tenho sérios problemas de gases.
– Como assim? Na minha frente você nunca...
– Sempre que fico nervoso, peido demais. Nem adianta tomar só água e fazer dieta vegetariana. Meus pais consultaram os melhores médicos, sem sucesso. Um amigo do meu pai teve pena e me ajudou. Me ensinou os truques de sua profissão e hoje eu tenho uma vida normal.
– Truques da profissão? Ele é o quê? Médico? Instrutor de boas maneiras?
– Não. Ventríloquo.






Essa aí é a Celly Batto, prima da Sarah Donna que jurou que ia casar virgem.

Tá esperando até hoje pelo príncipe encantado...